A porta de um escritório de advocacia, para muitos, é a última fronteira antes da batalha. E quando o assunto é a guarda de um filho, essa batalha não é por dinheiro ou por um bem material. É pelo bem mais precioso que existe. O ar fica denso, as palavras pesam e a escolha do profissional que vai te guiar nesse campo minado pode definir não apenas o resultado de um processo, mas a paz dos próximos anos da sua família.
Esqueça o que você vê nos filmes. Na vida real, a disputa pela guarda de uma criança raramente tem um vencedor claro. O que ela sempre tem, invariavelmente, são cicatrizes. O objetivo, portanto, não é “ganhar”, mas sim proteger, minimizar os danos e construir uma solução que funcione na prática, no dia a dia caótico de levar e buscar na escola, de dividir feriados e de cuidar de uma febre inesperada no meio da madrugada.
Como jornalista que cobre os corredores do Judiciário há quase 15 anos, já perdi a conta de quantas histórias eu ouvi. Histórias de pais e mães que, no desespero, entregaram seus destinos nas mãos erradas. Este texto é o resultado dessa experiência, uma tentativa de traduzir o “advoguês” e oferecer um guia realista, sem promessas fáceis, para uma das decisões mais importantes da sua vida.
Por que a escolha do advogado é o ponto de virada?
Vamos direto ao ponto: um advogado não é apenas um representante legal. Em uma ação de família, ele é seu estrategista, seu conselheiro e, por vezes, a voz da razão quando as emoções ameaçam tomar o controle. A escolha errada pode transformar um processo que poderia ser consensual em uma guerra de trincheiras.
O advogado “pitbull”, aquele que promete “destruir” a outra parte, pode até render uma boa cena de filme, mas na vida real, costuma deixar um rastro de terra arrasada onde seu filho terá que crescer. Isso não é uma vitória.
“Olha, é… é complicado. Meu primeiro advogado só falava em atacar, em provar que o pai era isso e aquilo. Perdi um ano e muito dinheiro nisso. A segunda, não. A segunda sentou e perguntou: ‘O que é melhor para o Lucas, na prática?’. Mudou tudo”, me confidenciou certa vez Mariana S., administradora e mãe de um menino de 8 anos, na porta de um fórum em São Paulo.
A advocacia de família moderna, a que realmente funciona, não é sobre guerra. É sobre um complexo jogo de xadrez, onde o objetivo é proteger o rei e a rainha – seus filhos.
O que buscar em um advogado para guarda de filhos?
Na hora de procurar, alguns pontos são inegociáveis. Não se deixe levar apenas pela indicação de um amigo ou por um site bonito. O buraco é mais embaixo.
Especialização não é luxo, é necessidade
Você não iria a um clínico geral para uma cirurgia no coração, certo? O raciocínio é o mesmo. O Direito de Família é uma área cheia de detalhes, de nuances psicológicas e de leis que mudam constantemente. Um advogado que faz “um pouco de tudo” – criminal, tributário e família nas horas vagas – é um risco que você não pode correr. Procure por alguém que viva e respire o Direito de Família.
Experiência que vai além dos livros
Anos de carreira são importantes, mas a experiência prática em casos de guarda é vital. Esse profissional sabe como o juiz da sua vara costuma decidir? Ele tem bom trânsito com promotores e outros advogados para negociar um acordo? Essa vivência de fórum, essa malícia de quem sabe a hora de brigar e a hora de recuar, não se aprende na faculdade.
Comunicação: Ele(a) te escuta de verdade?
Um dos maiores focos de frustração é a falta de comunicação. O advogado te explica os termos técnicos de forma clara? Ele retorna suas ligações ou mensagens em um tempo razoável? Ou você se sente apenas mais um número de processo na mesa dele? A primeira conversa já diz muito. Se você sai da reunião com mais dúvidas do que respostas, é um mau sinal.
Honestidade brutal vale mais que promessas vazias
Fuja, corra para as colinas, se um advogado te garantir 100% de vitória. Isso não existe no Judiciário. Um bom profissional vai te apresentar os cenários possíveis, os pontos fortes e, principalmente, as fraquezas do seu caso. Ele vai alinhar suas expectativas com a realidade, mesmo que a realidade seja dura de ouvir. Desconfie de quem pinta um mundo cor-de-rosa; a conta dessa ilusão, mais tarde, pode ser alta.
Onde encontrar e como filtrar os candidatos?
Boas indicações ainda são um caminho, mas sempre com um pé atrás. O que funcionou para o seu primo pode não funcionar para você. Algumas fontes para começar a busca:
- Site da OAB do seu estado: Permite consultar se o advogado está com a inscrição regular.
- Indicações de outros profissionais: Psicólogos e terapeutas que lidam com famílias em litígio costumam conhecer advogados com perfil mais conciliador.
- Pesquisa online criteriosa: Verifique se o advogado produz conteúdo, se tem um site profissional e se as avaliações (lidas com bom senso) são positivas.
Depois de listar 2 ou 3 nomes, marque uma consulta inicial. Essa primeira conversa é uma entrevista de emprego – e você é o entrevistador.
Checklist para a Primeira Reunião
Ponto a Avaliar | O que Observar | Sinal Vermelho |
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Escuta Ativa | Ele(a) deixa você contar sua história ou interrompe a todo momento para dar soluções prontas? | Mal te ouve e já traça uma estratégia de “ataque total”. |
Plano de Ação | Apresenta as opções (acordo, mediação, litígio) e os prós e contras de cada uma? | Fala apenas em entrar com o processo, sem mencionar alternativas. |
Transparência Financeira | Explica em detalhes como funcionam os honorários, custos do processo e formas de pagamento? | É vago sobre valores ou pressiona para um fechamento rápido do contrato. |
Empatia vs. Piedade | Mostra que entende a sua dor, mas mantém uma postura profissional e focada na solução? | Alimenta seu sentimento de raiva ou vingança contra a outra parte. |
A questão financeira: O barato que sai (muito) caro
Sim, honorários advocatícios são caros. E é tentador escolher o mais barato. Mas em uma disputa de guarda, essa economia pode ser um tiro no pé. Um profissional mais experiente e especializado pode cobrar mais pela consulta ou pelo processo, mas sua capacidade de resolver o caso de forma mais rápida e eficiente – talvez até com um bom acordo que evite anos de briga – pode representar uma economia imensa de dinheiro e, principalmente, de saúde mental.
Converse abertamente sobre valores e formas de pagamento. Um contrato claro é a base de uma relação de confiança.
No fim das contas, a escolha do advogado para a guarda do seu filho é um ato de responsabilidade. É sobre encontrar um parceiro técnico que entenda que, por trás dos papéis e dos carimbos, existe o futuro de uma criança. E esse futuro não tem preço.
Perguntas Frequentes (FAQ)
Preciso mesmo de um advogado se a guarda for consensual?
Embora não seja obrigatório para redigir o acordo, é altamente recomendável. Um advogado garantirá que o acordo seja juridicamente sólido, que não deixe brechas para problemas futuros e que todos os pontos importantes (convivência, pensão, decisões sobre saúde e educação) estejam claramente definidos e homologados na Justiça, o que dá segurança a todos.
Qual a diferença entre guarda compartilhada e unilateral?
De forma simples: na guarda unilateral, apenas um dos pais toma as principais decisões sobre a vida do filho. Na guarda compartilhada, que hoje é a regra no Brasil, ambos os pais são responsáveis por essas decisões. Importante: guarda compartilhada não significa que a criança vai morar metade do tempo com cada um. A residência fixa (base de moradia) é definida com um dos pais, e o outro tem o direito de convivência (visitas) ampliado.
E se eu não puder pagar por um advogado?
Você tem direito à assistência jurídica gratuita. Procure a Defensoria Pública do seu estado. Eles são profissionais qualificados para atender quem não tem condições de arcar com os custos de um processo judicial. As faculdades de Direito também costumam oferecer núcleos de prática jurídica gratuitos para a comunidade.
Posso trocar de advogado no meio do processo?
Sim, você pode. É um direito seu. Se você não está satisfeito com a condução do seu caso, pode revogar a procuração do advogado atual e contratar um novo. Apenas se certifique de formalizar o encerramento do contrato anterior e acertar os honorários devidos pelo trabalho já realizado para evitar problemas.
Fonte de consulta para dados sobre legislação e procedimentos judiciais: Portal de notícias G1 e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).